sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Vivendo num Universo dual

ALMAS GÊMEAS


                   A realidade mostra-se múltipla em tudo no Universo e conosco não é diferente, pois vivemos sob o império da lei de sociedade, uma lei de conjunto, de variedade, de relação.  Sozinhos nada realizamos, porque não estamos perfeitos ainda. E sem chegarmos à perfeição não somos absolutamente auto-suficientes.  Como homens, isto é, Espíritos em meio à evolução, apresentamo-nos tal qual nos fizemos.  Faltam–nos faculdades, recursos, experiências, virtudes, conhecimentos.  Muita coisa ainda permanece latente em nós, muito mais do que já pudemos desenvolver.  Necessitamos uns dos outros, sem nenhuma sombra de dúvida.

                        E no início, como éramos?  Se a lei é de sociedade, de relação, teremos sido criados aos pares?  Éramos um só corpo e dois seres, como no mito platônico dos andróginos?  Teremos, então, sido divididos e afastados da nossa metade?  Passamos a viver experiências isoladas, encontrando-nos vez por outra?  E a mensagem contida no mito de Eros, que nos diz que buscamos no outro aquilo que nos falta?  Como explicar o conceito das metades eternas?  Existem, de fato, almas gêmeas?  Por que essa idéia fascina tanto o ser humano?  

                        Bem, Emmanuel, no lirismo de suas reminiscências, marcou nossos corações com um inesquecível poema, que compusera em sua juventude, dedicado ao coração amado de Lívia, com todo o ardor romântico do latino.  E iniciou-o assim:  “Alma gêmea de minh’alma, flor de luz da minha vida...”  Essa frase enche de inspiração a fantasia dos apaixonados e faz pensar os mais racionais.  Quem é, afinal, nossa alma gêmea?  Por que tantas uniões infelizes?  Por que tanta tristeza quando alguma coisa não vai bem em nossa vida afetiva?  Por que vivemos a pensar que haverá alguém especialmente destinado a nos fazer absolutamente feliz?

                        Em verdade, ninguém pode ser a metade de outrem. O Espírito é um ente metafísico, e como tal não se divide (L.E., perg. 92).  Somos também completos em nós mesmos, porque marcados pela perfeição divina.  Tudo de que necessitamos para atingir as cumeadas da evolução espiritual está em nós, e não fora de nós.  O que encontramos fora de nós, genericamente falando, são os estímulos para o auto-conhecimento e o auto-desenvolvimento.  Cabe-nos o esforço, pelo trabalho permanente, de desenvolver esse potencial divino. 

                         Somos perfeitos em essência e a cada encarnação exteriorizamos um tanto dessa perfeição.  Mas, como o iceberg, cuja maior parte permanece submersa, temos desenvolvido apenas uns dez por cento do nosso verdadeiro potencial, enquanto a maior parte deste repousa intocada no leito profundo de nossa própria individualidade e, portanto, submersa  em nós mesmos.  Externá-la é a nossa meta;  tempo e oportunidades é o de que necessitamos para tanto.

                        Somos, uns em relação aos outros, quando muito, Espíritos simpáticos, marcados por maior ou menor afinidade.  Ou estamos em perfeita concordância de tendências com alguém e nos identificamos como Espíritos afins, ou não estamos e não somos, ainda.  De uma forma ou de outra, conservamos sempre nossa individualidade, que restaria comprometida se precisássemos de outro ser para nos completar.  Somos seres completos em essência, e essa é nossa situação permanente.  Consideremos, então, como seria triste e desolador se precisássemos ser completados por alguém em especial e este alguém estivesse ausente de nossas vidas.

                        Vivemos procurando a felicidade, imaginando-a nas coisas do mundo, na riqueza, na posse de bens de consumo, no poder, na fama.  Quando não, achamos que a felicidade está no ser amado, e passamos a exigir dele que nos faça senti-la.  Depois de algum tempo alimentando essa ilusão, descobrimos que, tendo tudo o que almejamos, não somos verdadeiramente felizes.

                        Quantos pares não se encontram, em circunstâncias aparentemente casuais, e logo se identificam como “almas gêmeas”:  vivem intensamente o seu romance, firmam compromisso e passam a conviver no dia-a-dia.  Cedo ou tarde, porém, descobrem-se muito diferentes um do outro.  Vêm os conflitos, as decepções, as frustrações, as desilusões, os sofrimentos, a separação... 

                        Kardec investigou a questão com os Espíritos que lhe proporcionaram as respostas insertas em O Livro dos Espíritos, e eles lhe disseram que “não existe união particular e fatal entre duas almas” (perg. 298), desfazendo assim a idéia de que um Espírito estivesse destinado a viver ao lado de um outro em particular, eternamente.  Na verdade, vivemos num plano de lutas e progresso contínuo, e somos sempre atraídos para a situação que necessitamos vivenciar, pois “da discórdia nascem todos os males humanos; da concórdia resulta a felicidade completa”, disseram os Espíritos em complemento à mesma resposta.

                         Deus, então, nos criou e dotou-nos de tudo o que é necessário para o nosso desenvolvimento e a nossa felicidade real.  Mas, suprema maravilha da Criação, fez com que nos sentíssemos atraídos uns pelos outros, que nos aproximássemos e convivêssemos para que pudéssemos desenvolver o tesouro que guardamos cariciosamente no mais profundo de nossa alma.  E um dia, totalmente libertos do jugo da matéria, agradeceremos ao Pai esse sublime desejo de permanecermos ao lado de alguém que tanto amamos, durante algum tempo, para compreendermos o que é de fato o Amor e afinal alçarmos “sozinhos” o voo alcandorado do Espírito para as regiões indescritíveis da luz e da paz infinitas, reconfortando-nos no regaço divino.

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